25.6.13

o livro que você me deu é espetacular.
comecei a ler no terminal barra funda, parei e voltei a ler quando clareou o dia, já no hotel.
de repente votuporanga começou a parecer demais com o illinois, demais. a planura da topografia, o calor, as feiras agrícolas, a vontade de sair correndo dali.
todos os interiores serão feitos disso? lojas de amortecedor, lojas de fertilizante, minas de moto, meninos em carros grandes, um tédio ensurdecedor, a música country, o cheiro das casas dos bichos.
ri de gargalhar em algumas passagens e começou a acontecer o que eu já sabia: entrei no processo de apaixonamento pelo autor morto. não é muito frequente, mas quando acontece é sem volta.
me preocupei com isso.
não consigo trabalhar. comi a terceira das quatro barrinhas do kitkat.
não lidamos com açúcar.
não lidamos bem com açúcar.
o quarto do hotel é extremamente barulhento.
não consigo trabalhar.
peter gabriel quer que eu saia pela janela.
vou deixar seu livro trancado no cofre e marcar hora pra abrir.
não consigo trabalhar.

7.5.13

obrigada por esta visita. desta vez você se sentiu melhor, você não surtou muito, sua perna não incomodou demais e você quase não tremeu. 
não achei você magro demais. nem gordo, e você foi o que é mas pouco praticou. chegou a dizer isso. no primeiro jantar quando me indignei com alguma questão e disse que você estava me tratando como tonta, 


você disse: não, isso é você que está inventando aí pra acreditar em alguma coisa esquisita. 

era isso. em casa de volta, pensei se você não é alguém ao contrário do que sempre pensei, está à frente da lucidez de toda a gente junta. e se seu papel é me testar e por à prova, pra que eu duvide de mim mesma. pra que não seja tudo fácil.



22.11.12

quase tudo que escrevo
é sobre sono e idade

8.11.12

se dentro da terra é mais frio e mais abaixo é mais quente
eu devo abrir todos os sentidos além do limite, quase além, quando estou quase dormindo
porque nesses minutos faço muito mais que no dia inteiro
crio e digo o que não poderia dizer se estivesse acordada
com roupa de trabalho
sentada na condução

foi quando passamos no cemitério da consolação
você me disse nesse estado eu invento tudo acabei de ver uma esfera branca e

eu já estava dormindo

30.10.12

vamos fazer um faceboobs onde as pessoas não morrem porque tem dinheiro, ou porque não tem, ou porque dizem o que contraria, ou vão morrendo por causa do trabalho, morrendo e cuidando do dinheiro dos outros, se mandam pra longe pra cuidar dos dentes dos outros e ficam sem sua família, ou matam quem amam por medo de ficar sozinhos, ou arrancam mesmo os cabelos porque são obrigados a ver o anúncio antes do youtube, vamos fazer, nós que importamos e nos importamos e sabemos que somos quem somos, porque tem quem não queira, mas tem nós que queremos, que estamos aqui na espreita, respiramos contido e vemos nos olhos de nós outros o temor e a semente, quando a tevê mostra que nossos amigos estão limpando o supermercado com medo da tempestade, nós também esperamos o bicho que vem lá, um gigante pedregulho, a falta de recursos, um assolamento de insanidade em que vamos segurar a onda eu e você com nossos relâmpagos, nossa trança e nossos paninhos, nossas ilhas, nossos bonecos, nossos pedações de madeira, nossa colher de pau, nossos filmes e desenhos, nossos óculos, nossos meridianos e pontos de alarme, nossos pés sem sapato, nosso medo do escuro, nossos viadutos em ruínas, nossos abraços e nossa conexão certeira que diz que 'você eu quero ver do outro lado'.

2.10.12

quando amanheço na casa da minha mãe
antes de acordar vou até a cama dela
eu e meu cachorro vamos
lá chegando
eu e meu cachorro deitamos
na penumbra ainda dormindo ficamos alguns minutos
e acordamos devagar
nesses minutos muitas coisas acontecem
como:
dormir
não dormir
não querer acordar
ouvir minha mãe dizer que estou com respiração de sono
ouvir minha mãe contar o sonho que acabou de ter
rezar pra ser sábado quando abrir os olhos
cochilar
não conseguir acordar porque não dormiu porque não parou de pensar

na noite do outro dia fizemos o de sempre
eu e meu cachorro
e tinha sido uma noite sem acordar sem dormir só pensando
eu e minha mãe (meu cachorro não)
sem abrir os olhos lamentamos ser assim
inquietas com as ideias
suspiramos sem ter o que fazer

então ela resolveu o problema
disse baixinho deve ser por isso que gostamos das coisas
e as pessoas gostam da gente
é muito chato ser alguém parado

acordamos e fomos tomar café

26.8.12

trintas

a nossa idade traz paciência e nervosia. traz a conformidade e a urgência, é nós quem sabe que não tem o tempo todo do mundo. na nossa idade temos ainda muita saúde, estamos brilhando radiantes, está saindo pelos dentes, pelas unhas um estrondo de energia, estamos mais lindos do que sempre estivemos, mas já sentimos a cara ressecar. a ressaca que demora mais dias pra passar, o amor que pega mais manso, se sente a raiva bater mais forte e processar mais rápido. a real é que é muito melhor que há dez anos e nossa pele mais dura, nossos olhos mais abertos, sentem super, super profundo.

9.8.12

muito bem

minha provação é meu castigo e ruína
quero uma coisa que não quer ser minha
mesmo que eu não queira ela amarrada não pode e não quer ser

tantos ganchinhos, quantos anzóis me puxam pela roupa, me agarram pelos cabelos
quantos me beliscam e chacoalham
tantos bracinhos me afagam e sofás me convidam
tantas cozinhas se oferecem e tantos endereços me desejam
moi
moi não quer

eu quero aquele, do fundo da vitrine, empoeirado e descascado, aquele que vai dar defeito logo mude de espaço
o que não pode ser vendido porque é parte do mobiliário de outro universo
caí na minha teia e não sei sair

gaivota que comeu o peixe
comeu o peixe
comeu o peixe
até que chega tubarão branco
me comeu
comeu o peixe

3.8.12

vai ser uma pena mesmo, vou sofrer caso sobre depois que a humanidade for inacreditavelmente detonada, porque deve ser isso, eu sei que deve, não sei se vai, só sei que merece pelo acúmulo de cagadas e egoísmos e pela mediocridade principalmente, quase sempre por ela, um limite não sempre claro entre o que está ok e o que podia ser feito melhor, mas o mais é tudo de uma nivelação média conformada faustão cumpádi washington que putamerda, e caguei também pra reforma ortográfica e pro motorista da secretária da ministra, e lamento, lamento mesmo por cada mini de energia dispersado com uma coisa que não vai fazer a menor diferença no conjunto, mas tudo tem um outro lado e é aí que se explica porque amamos quando encontramos jóias gêmeas nossas e, enfim, tem tanta música bonita, tem uma cacetada de sentimentos lindos jorrando ou querendo ser jorrados e barrados pelo medo, mas eles existem estão na espreita e só porque existem fazem parte do mundo, e só por isso o mundo é mais incrível, por exemplo o medo cotidiano de envelhecer porque a gente se acha menino demais pra essa idade que tem, sempre parece que tem alguma coisa em descompasso, esse temor dá uma dignidade pra gente, sabe, ser tão senhor de si e sofrer em segredo, e além disso tem o cinema, tem os bebês de dois anos, que são a melhor coisa e tem as palavras, as conversas, o riso, e tem quando eles não estão lá mas tem o olhar pra segurar todo o lance, um olhar mínimo que é só a portinhola que abre e fecha de um puta vesúvio dentro da pessoa que não deve sair por ali e fica dentro brilhando em pantone 1665c, em smooth sparkles sem mesmo que ela saiba o que é aquilo lá, e além disso tem as comidas, eu digo as frutas, temperos e a carne de carneiro principalmente e as receitas que a gente faz em casa ou aprendeu com nossas várias mães, tem as coisas que a gente só sabe que existem porque uma pessoa foi lá descobrir aquilo tipo um dinossauro pequenininho, uma interpretação de sonhos que tira a responsabilidade das suas burradas de cima dos outros, um movimento interplanetar silencioso e lento, e aí tem a mágica que ninguém domina mas que só existe porque nos damos conta dela, alguns de nós é claro, e tem a sensação de estar dentro de um corpo humano, observar as próprias mãos frente e verso e frente e verso, encontrar antepassados num lugar pequeno assim de si, e meter esses dedos dentro dos prórpios cabelos, ou da cabeça de outro alguém que vai fechar os olhos de satisfação e confiança, e por toda a comunicação que não é verbal, sem desmerecer as palavras que como já disse são quase tão bonitas como um cachorro depois de comer uma coisa que ele adora, esse silêncio que a gente é surpreendido por ele ou que a gente deixa acontecer porque sabe que é foda, isso é o que eu vou sentir mais falta da humanidade, se chegar um dia que a gente não possa mais escolher as comunicações e apenas precise delas, quando elas forem só uma necessidade de novo, como deve ter sido no começo.

5.6.12

pai, ainda durmo com suas camisas velhas.
elas ficam mais finas a cada lavada, eu não me importo, acordo descabelada, cheirosa, decrépita, maquilada, radiante no sábado de manhã e tenho tudo mais pela frente: a manicure, os bebês gêmeos, a sauna.
você sabe pai, que eu não sinto mais aquela magia?
já soube algum dia?
eu sinto a alegria grátis e o contentamento, hoje de manhã chorei no ônibus com a beleza do outono na montanha, mas é isso.
e que eu sonho toda noite com as pessoas mais improváveis, os comediantes e os mortos, sonho que sou a secretária deles, e quase toda semana que o ano está terminando e faltei todas as aulas de geografia.
você sabe que eu só posso te contar metade das coisas?

segunda

numa segunda feira caveirinha contente subi suas escadas e toquei sua campainha comi seu pão com manteiga te dei um tapa no meio da cara tirei sua roupa gritei pros vizinhos pela janela desliguei sua tevê pus o cabelo no lugar e fui embora.
te deixei lá.
eu só conseguia pensar no cigarro que ia fumar no ventinho da rua.

22.5.12

hoje vi uma senhora tão gorda que pensei quanto tempo levaria pra ela emagrecer. vi um magrinho limpando o queixo da sua gorda com o dedo.
hoje vi um casalzinho no cinema. eles não tinham muita intimidade ainda. o filme era ruim e ele levantou no meio pra comprar pipoca. ela ficou cheirando o casaco dele de olhos fechados no escuro.
hoje pensei numa alternativa totalmente diferente porque o acaso, que é só um nome, se apresentou inteirinho pra mim, maior que uma janela, maior que o jardim das delícias.

13.5.12

um dia descobri que tenho a língua maior que a boca. não é modo de dizer, ela é de verdade mais comprida e mais larga que a caixa onde vive. até esse dia isso não era um problema, só achava curiosas as marcas dos dentes fazendo um babadinho nas laterais. mas agora vai ser preciso me acostumar com a novidade.
na noite desse dia chamei meu marido de mãe, enquanto estava sonâmbula. carreguei pra cama uma das nossas plantas pensando que a proximidade com a madeira ia acalmar o espírito do sono. arranquei os colares e os brincos porque o metal enfraquece a madeira. agora minha cama está cheia de terra.

12.5.12

você é o que eu sou e tudo mais que se pode tirar do bolso de um avental, como explicar o que você fez de mim? tua cachorra canta na abertura do jornal nacional, você sai de casa com um brinco diferente em cada orelha, abre a porta na cara, pira os telemarketings e ri de não se aguentar quando o pai das suas filhas arranca as calças pela cabeça. você é a moça que aprendeu a se divertir depois de tanta chatice, tu escolheu a melhor opção. você dança e canta e entra no baile com a gente, mama, você é avó, e você ri à toa sem preocupações maiores e todas as finesses en français que você me ensinou, como usar guarda chuva vermelho pra ficar coradinha e aquele molho de salsa que a gente não conta. mulher mais linda sempre capaz das barbaridades mais doces imagináveis, quem te conhece que te ame, não tem um que não pergunte por você. sem dúvida você é uma grande diversão na minha vida, que legal a gente estar juntas aqui.

16.4.12

my funny frankenstein

matei todos
ambos e os dois
a ida e a volta
eu vos matei oh frank

nem um pagode sentido
nem um sertanejo antigo
nem uma noite ruim
uma refeição mal dormida
um pãozinho mal sonhado

uma tia debaixo dos panos
no meu pesadelo
os pássaros pendurados
o faisão, o avestruz
o cormorã e o êider
pendurados na boca ensanguentada do macaco branco

nem bob esponja
nem cinema 3D
não deixei morrer
eu matei mesmo
eu mato mesmo
e adeusinho







você nem era tão engraçado assim

27.3.12

és meu prato do dia

stood still
between cat and dog
não me diga que horas são

um frio
suor
cafezinho

e comi aquela barba

24.3.12

this hidden side
is my main side

12.2.12

o andar do gato cego
ele sobe nos canteiros
sobre o salto vagabundo
não quer mais sentir a noite
deu tudo errado
ela não apareceu ela nem telefonou
o gatinho preto e bêbado
ele abre a camisa arranca o paletó
morde sua própria gravata
ele vai pra casa fumar baseados
comer doritos
jogar guitar hero
que nós os humanos, nós somos capazes das últimas consequências e a gente acha que chegou lá, a gente jura, porque nos adaptamos a qualquer coisa, ao frio, ao gelo, ao calor do deserto e rajadas de areia, às dores nas costas e nas juntas, ao desamor e à falta de cuidado, à fome e ao lixo, à televisão, à roubalheira e à decadência da beleza, ao peso da mochila, à religião dos outros, às filas, ao ar condicionado, à arrogância, à falta de tempo e à velocidade cada vez maior que o tempo tem usado pra passar, às intoxicações alimentares e às tretas familiares, às escolhas das pessoas, aos caprichos dos clientes e ao vento que nunca pára de soprar em alguns lugares. mas a verdade é que a gente sabe muito pouco.

31.1.12

SP















'eu absorvo todo céu
qualquer inferno'

era um filme que falava visual e emocionalmente porque é que eu tenho que ficar aqui
eu não sei, mas ele sabe
bote play, ele diz
é essa cidade que foi minha antes de nascermos
eu vim muito depois dela, quem sabe
mas estou aqui no topo da sujeira, em outro tipo de quebrada, outra variação de baixeza e imigrantes, marginália e energia sexual, e dinheiro, diversão e famílias que se constroem em fins de semana, em dias de trabalho

é aqui, eu não saio, não quero deixá-la, não, por nada, te amo desde sempre e agora completamente
metropolinha que me mordeu
aqui minhas plantas crescem
eu choro de cinza e frio
o vento gelado toma o lugar do suor
escuto tudo e observo as coisas minúsculas

a maior cidade do meu mundo
foi preciso encontrá-la pra viver no detalhe e olhar pra dentro

21.1.12

mini

eu espero
você chegar na minha idade

14.1.12

antes que eu me seque e fique triste

quem é esse de chicago? quem é esse de annecy que vem e fura o cerco
põe os guardas não mortos nem adormecidos mas bêbados e entre abraços militares, desfazendo-se em juras de lealdade e olhares enviezados na real do dia seguinte

dá pra ficar mais um pouco, a gente pode?
mas se anoitecer. e a batida de maracujá açucarar no fundo.
e se a escrotice geral ganhar, se os macacos-pecinhas da massa amorfa e suja e comedora de lixo que está lá fora, se eles conseguirem entrar?
não posso com esse resto, não com eles
não posso com interrupções e barulho de obra

rasgo é com uma dentada só cheia de fúria a meia calça pronta pra festa
era eu ou não era? ou era eu mais você quando tudo escorria pelas frestas do pier
e seguramos.
toalha branca. te abraço.

12.1.12

vamos gastar com o que importa.
quer ter filhos, quer não ter.
podemos parar o tempo e gastar com os filhos dos outros, ser tios pra sempre,
e sempre sobrar pro vinho, pras canetas mais caras, pras quengas.

(such a sad man, ainda não atinei que bicho você é, depois de tanto tempo. um lagartossauro. uma raposa, te falei que você era raposa, mas era porco espinho no final das contas, as contas, quanto amargor, quanto recalque, porque meu bem)

lentinha, aipo, curau
quem já viu a gema descer ralo abaixo ela inteira?

nossa ilha, nossa pracinha e o gato cego
isso é eu sendo só eu, eu e os meus outros. é eu quando tu mesmo já não compartilha mais nada

eu estou criada.
posso eu falar com quem eu quiser.

15.12.11

cartinha

e ó
eu passei mal mesmo
não foi o lance do coração
isso existe
e acontece
mas não foi por isso que eu não apareci

digo porque vc ficou falando
sei
sei
....
sei
pras coisas que eu disse
ok?

beijo
brigada

30.10.11

que a mulher deve andar sempre do lado direito
cozinhar ovos sempre aos pares
e preservar o mistério da toalete

sonhei que morria e ia pro céu
lá fui recebida na porta
por todas as manicures que já passaram pela minha vida

24.10.11

sobre a linguagem e as palavras--não sobre a comunicação

que incrivel isso né? comenta
née??
o encadeamento lógico das coisas
um fluxo de texto
a objetividade do discurso
a clareza da argumentação
a entonação a assertividade o corpo que acompanha as idéias
e como nós ainda sabemos fazê-lo

falou falou
subiu os olhos pro céu
descansou as costas na porta da sacada
e apoiando a taça na ponta do meu pé
--meu outro mexia nas mudinhas da horta-- disse

-que brisa

e não só

disse
mais nada
ninguém escuta
as pessoas não vão nem saber

sobre estar sozinho no mundo
é o que dizem
deve ser verdade

she’s got a bad temper
- one might say -

but hey

i’m always on and out of time
i can speak portuguese
i like deep stories

isso basta

18.10.11

senhor samurai faça-me o favor
corte logo minha garganta com sua lâmina certeira
deixe que meus cabelos brotem cerejeira
no seu chão de cabeça pra baixo

senhor beduíno
seja fino
trespasse meu coração com esse alfanje formato lua
e me dê de comer pros camelos

moura torta venha furar meus olhos de passarinho
com a roca fina que você tomou emprestada da bruxa
e deixe que os jabutis façam a festa no céu

senhora dona louca rainha maria de copas
mande cortar-me a cabeça
mesmo que eu pinte suas rosas perfeitinhas
e me use como pó de arroz pro resto da eternidade

maitresse erzulie
apareça na hora certa
e diga pra essa gente toda
que palhaçada é essa?
tirem as mãos da minha menina!


despeje no vento seus milhares de trianglinhos coloridos cortantes
a sua nuvem venenosa de besouro-suco
uma baforada insuportável do nosso perfume azul
mais cinco bolinhas do gás do riso
dê a ordem pra bandinha começar a música
e deixe que eles se engalfinhem

me leve pra casa e me conte uma estória de dormir

9.10.11

legacy atlantis banjoman

da última vez que encontrei o homem
ele estava vestido e general
generalzinho, eu disse
mas era um disfarce
de alguma maneira voltei àquele dia quando entrou água no sapato
e o frio era tão gelado por dentro e por fora que
eu só queria um tênis velho pra alegrar a mocidade

ah as pessoas me cansam
me cansam, me esgotam
a maioria
sem dúvida eu diria
todas as pessoas
menos algumas delas

coração de metal
na manteiga
esse meu

eu torço por você
com uma responsabilidade extra
e te recomendo

alice













so far

5.10.11

te falta ousadia pra zunir a valise escada rolante abaixo. vi que você ficou lá no topo calculando as consequências mas desistiu, foi pra área permitida e acendeu um cigarro.

10 gotas

crab apple
em silêncio, crab apple
olive e mimulus
na luz de olhos fechados no escuro de olhos fechados no escuro de olhos abertos
uma formiguinha no meu pescoço
na luz de olhos abertos
um escaravelho no meu coração
livra-me da culpa, senhora

ele me disse (primeira coisa do dia)
- é impossível desenhar um 6 rodando a perna no sentido horário
é impossível e é irresistível fazê-lo

doutor atílio sinaliza e confirma
com aquela bunda enorme
na hora do recreio dos pequenos
que eu passei por onde queria parar

-pra ver a noite
não existem olhos nem lugar-

29.9.11

enquanto eu comia
ouvi os garçons em volta se perguntando
o que era 'pragmático'

a pergunta passava de um pra outro
e isso foi por uns minutos
se um deles tivesse me perguntado eu não saberia responder

28.9.11

dancehall

minha amiga dançando me disse como ama a palavra 'boogie'
eu adoro essa palavra, escuta o som
ela dançava de olho fechado, depois buscava mais um drink pra mim

14.9.11

nesse dia encontrei alguém antigo, de antes de tudo começar
pedi que não fosse embora sem falar comigo
pôs os filhos pra dormir e voltou querendo saber
eu queria só ficar um tempo ali, um tempo parado
e foi o que eu disse

olhamos um casal lado a lado
um que não é um par e se vê poucas vezes na vida
que quando encontra quer só parar perto
talvez dividir em silêncio o que já foi dividido
por muitos anos, algumas vezes, por pouco tempo
ele riu do que eu disse, ele riu feliz e triste, e concordante

-olha a gente quando ficar velho.

8.9.11

eu gosto de ver o descabelamento da classe média-alta diante das questões que a vida madura traz -- como os casais de itaipu lidam com a traição, a saída dos filhos de casa, a indifereça do par, a assepsia da sala que eles mesmos construíram.

dentro disso muitas vezes existe uma união e uma memória, um motivo ou mais, impenetrável, e porque as novelas não mostram que existe o silêncio feliz-infeliz, confortável, pacífico, conivente, ensurdecedor, porque não mostram que existe o álcool que aproxima as pessoas do outro, ou delas mesmas durante a noite?

6.9.11

meu cabelo ama o sol
meu coração galinha de leão

não sou suficientemente filha da puta pra determinadas movimentações sociais
no meu banheiro.

tem um pedaço de céu preto.
ninguém liga.
só eu quando vem a visita
mas vai ser porque quer
pode me ensinar a geografia das coisas.
eu paro pra escutar.
ela disse eu me sinto esquizofrênica
mas que foi bom, foi

21.8.11

tem coisa que eu gosto de pensar que podia ser pra qualquer um no mundo, mas é pra mim.

17.8.11

cigarro aceso
papagaio empalhado
rasgando normalidade

5.8.11

Visita

olhos por olhos
um copo, uma gota dágua
atrás deste flaflu
desta caixinha de música
desta bala de goma

teu gosto, tua cor, teu som, teu meu



----------------------------

Ana Cristina Cesar

18.5.11

simpatia

let them go
let them cum let them come back
let them fall in love out there
let them eat poisoned fish on a market at the east
cursed meat in a mayan pyramid
infected mushrooms in paris
let it happen let it be
release them

then sit and wait
be aware of the beginning of the thing
listen to when it starts
hear the deaf sound
of the resurgent wave
the one that will always return
see it reborn and moan
competitividade e violência agudas
o fim do corredor
todas as negas bêbadas no sofá
a ruga da boca na sombra escura
eu não quero esquecer

4.4.11

i told someone you were my user
but this person happened to be your user
then we exchanged numbers

31.3.11

tv

o tempo todo sento em imagens sobre uma tevê acesa
mas nas janelas que vejo da minha
essas luzes se reproduzem em cores e em outras luzes
decerto elas precisam existir, fora de mim
assim sei quem está vendo o mesmo canal

minha mãe me ensinou a usar um guarda-chuva vermelho
porque a luz filtrada faz corar o rosto
eu lembrei disso quando daquela vez você me levou no puteiro meu bem
uma fake da cubana cantava gipsy kings

no quarto tem um espelho
vejo a rua e não eu
muitos anos ou mais e quase nada aprendi, lo siento

24.3.11

eu tenho a curiosidade de como é essa pessoa se perdendo em palavras ou cuspindo no inimigo
no vale tudo do trabalho diário e noturno, eu quero saber, eu não quero perder a possibilidade de escolher o que é que eu quero descobrir, não quero fechar nenhuma das oito portas que generosamente botei de pé
valha-me nossa senhora do amor sabido! faz esse jardim crescer e não deixa a normalidade praguear nas minhas folhagens

11.3.11

enquanto a terra despenca no japão
nós desenhamos a planta
de uma casa perfeita

a colméia que deve viver nos sonhos
de qualquer homem,
qualquer mulher

um brinde a ela e
ao tempo que talvez nos reste

23.2.11

pare olhe escute

no aproximar do olho
se cega o sentido

o trapezista
o filho
o crítico
o cientista
o matemático
aparece e deita nos meus pés
e entre um me acalma e um mea culpa
mete eles pelas mãos

incrédula paro no osso que tem no meio da tua testa
(la mancha vermelha no nariz . não está mais lá)
olho pra tu de perto
olho porque posso
e o que vejo é outro

ainda desacreditando
quero correr do que criei

30.1.11

E37 E40




















eu sou aquela que nega na cara da prova
que não assume depois do fato
essa sou eu
a bela que escorre pelas pernas do homem crescido
que casou com outra pessoa
eu sou a que escapa quando a realidade aparece
esquecida na rua quente
engolindo o nó a meio caminho
(mas vocês não sabem da umidade
e o que ela estraga, não sabem)

é preciso fazer uma massagem vigorosa
no fiozinho por onde passa o estômago
é preciso, ninguém quer a doença

sentei na borda da cama, só pensei
que gostava em algumas horas de distração
uma coisa enorme que passou por mim
foi embora
afinal acabou
saiu pelo funil num pingo que era eu descendo a rua
tirando o sapato
deitando a cabeça no ombro de alguém
na frente da tevê
e entrou pra sempre no carpete

19.1.11

--é como se tivesse escutado ontem seu nome pela primeira vez--

11.1.11

sinto o impulso de proteger um homem da crueldade que tem no mundo dos homens

10.1.11

hoje eu era uma das três moças de amarelo
tomando café depois do almoço

eu só, elas sós
vendo
eu daqui fico só vendo
me leu
eu vi

gosto em você algo que não sei o que é
mas é mais de uma coisa
teu nome escrito em mais de um lugar
e
gosto da sua novidade velha
como se a vida e todas as coisas resolvessem o resto sozinhas
amarrando uma ponta solta e dissessem: olha só

(isso que você me fala
que o tempo passa em você arrancando tudo
com uma delicadeza que só o tempo pode ter porque
afinal ele tem sua própria maneira de passar
é uma banalidade em qualquer outra pessoa)

tenho uma vista
guardada no osso
eu vi
eu estava lá
com uma parte e outra descombinadas
apanhei do calor
logo eu
foi quando você pediu licença e caiu em mim

29.12.10

selva

foi como uma asa de avião correndo submersa
ela voava logo abaixo da superfície me perseguindo
o perfume da senhora ao lado e o céu de chuva
ele lambeu meu rosto do queixo à testa
cheirou a junta das minhas orelhas
igual a um macaco
eu ri demais
eu ri depois ainda de tanta ordem
nessa cidade onde a ordem nunca coube

e o garçom dançando
o seu pouquinho em pouquinho em cada música
o doce cheiro do morro, o doce meu cheiro de eu
curumim na roda da noite

calma aí prefeito
não quebre o viaduto
não esse que me leva de volta à casa antiga
sobrevoa árvore museu e mar
sinto que nunca vi isso antes

23.12.10

eu que penso em tudo mas só quando estou sozinha

Um dia de vida normal na minha cidade. É só que existe um clima de despedida boiando por aí, se não seria igual a outra quinta-feira.
Posso passar completamente de uma vida pra outra, de uma cidade pra outra sem grandes dores. Me acho fria nessa hora.
Estranhei o sotaque das pessoas e a quantidade de palavras que elas falam. Muitas vogais, as mesmas minhas. Estranhei a Uruguaiana, mas Copacabana tudo normal. As pessoas se encostam o tempo todo quando falam, a moça do laboratório no guarda municipal, o funcionário do museu no chefe da segurança.
A escolta passa na Presidente Vargas fazendo o maior escândalo que consegue, as pessoas continuam se movendo molemente.
As barrigas saltando pra fora das camisetas.
A truta no restaurante preferido ainda tem o mesmo gosto.
Os homens continuam olhando as moças de perto.
Os chefes de bermuda, e a vista do cortiço pela janela do escritório.
Os gays são menos aparentes, as mulheres são mais meninas.
O rapazinho não recolhe a amostra de amendoim que deixou na mesa.
Conheci um francês no metrô. Não, um francês me conheceu e deu seu cartão pessoal.
me téléfonn mocinha, parra tomarr alguma cóissa.
Os gringos pensam que eu sou gringa, eu mesma penso que sou.
A moça descalça um pé e leva ele pra cima da cadeira do bar enquanto conversa com a amiga.
É como se fosse tudo que já foi mas com outra roupa.
E o cheiro é igual só que diferente.


2.12.10

retorno da dor extrema exausta
escalo dez degraus para uma calçada de refresco:
duas moças bem vestidas, homem bonito, filhote de cachorro, turma de 7 anos no passeio da escola, policiais de bermuda, árvores azuis do natal.

eu faço ele rir, he said.
he sad.

he man.
he means.
he me.

what else?

8.11.10

and everytime

agrada-me a marca do tempo

la primera pregunta es: ¿qué es más macho?
la segunda pregunta es: até quando vai ser bonito envelhecer?
la tercera pregunta es: posso roubar a idéia do teu analista?

dê-me alguma razão para dizer sim.
vou dizer sim, mas me dê uma justificativa.

31.10.10

Sobre as aulas de ciências

pode desligar a luz que eu cheguei
pode chover o tudo e o necessário
me entendi contigo dessa vez
foi por isso que choveu
pode dar um nó no caramujo africano
aterrorizar os moleques voltando da escola
torna a cheirar a mirra toda vez que abrir o portão
na judería
redondela no tórax eu tu ele
vai deixando o carro virar uma segunda casa

não importa quem dormiu uma hora por noite
foda-se que isso não faz diferença quando se está aceso
é pelo prazer da matemática

18.10.10
















sempre não tem que dar em lugar algum
ela vai saber ligar a luz do quarto?
porque essa pode ser uma boa desculpa pra você fugir daqui

aguardei com as tartarugas
por medo do dilúvio destruir meus papéis
acabei presenciando uma beleza violenta
só entendi depois
tanta beleza

te llamó el teléfono
trin trin
era yo
mientras tu guitarra llora suave
contestas
-hola
me dices
-yo tengo la ropa limpia
hoy temprano la lavé
ahora no tengo traje para la noche

por carrer ample
baja
una y otra
por escudellers
todo recto
por el raval
me dices
-mira
você não tem que deixar a vida passar
você sabe

7.10.10

busca la negra
que perdeu
em torno do caminho
na volta quiçás
busca esta puerta abierta
pro rebanho passar
este sim este também
este no más
pega um trago de catchaça y tabaco
no te gusta
mas vou fumar até o fim do rolo
na beira da praia que me espera há pouco
é o fim
bay be
é o recomeço
o 9
diz que 9 é bom
melhor que 8
mais puro que 7
assim
me fui
para no más
o quiçás o talbez
me chama de pássaro e retorna
traz a asa da xicara
pousa sobre meu colo de bronze
mas eu não
eu fui
não volto
é isso
e fim


22.9.10

BEBA-ME

how did the razor find my throat?

13.9.10

alfama

Hoje era ouro ali. Era ouro. Dentro de uma porta, um castelo, um bairro, de uma cidade, tudo tão velho que nem o tempo era ele ainda, entrei à direita no portal. Alguma coisa encontrou certeira com outra bem na hora, e fez tudo que existe funcionar. Eu vi um quadrado e uma boca de pedra contra a luz, eu me vi no reflexo do vestido verde, dourada eu, dentro de outro castelo ainda menor. Presenciei o vento fazendo as curvas que ele precisava e a lua ao contrário como se fosse atrás do espelho. Cheirei a branca e a vermelha escutando o mesmo vento assoviando duas notas no tipo de árvore que não vive onde eu vivo. Nessa hora minha mãe disse PAVÕES e quando olhei pro dourado vi dois pavões embaixo de mim, seguidos por meninos e um gato preto que foram embora, mas os pavões ficaram ali rodando nos meus pés e de dois viraram quatro e então eram dezesseis pavões escalando sua árvore de dormir, um de cada vez. Escutei o vento de novo, não consegui saber o que era aquilo tudo. *De manhã meu tornozelo sangrando no chuveiro* eu pensei dizendo pra estátua do feminino que guardava o fianco do castelo. Joguei uma moeda na fonte pedindo pra ter sempre esse tipo de coisa, a vida toda. Eu não sonhei isso também.

7.9.10

o tipo da coisa

é assim que começa:
alguém te ensina o caminho e você vai
bom se não fosse só isso
é o tipo da coisa que você corre
melhor nem tragar
antes que comece
raios
porque pensa bem
se é que toda micareta tem um fundo de verdade
lembra
paro agora e guardo pro carnaval


5.9.10

quase não me lembro de você
sempre ocupado
sempre
senti o vento fazendo a curva
entre a clavícula e o músculo do colo
olhei as falhas do morro escorrido naquele dilúvio
olhei as ondas amolando o barco que mudou de nome
falei
do dingo australiano
do panteão nórdico
da proteína tata
quem atura essa realidade toda?
quero mais não
veja se para de fazer o favor

1.9.10




isso explica quase tudo
que existe e precisa existir
e só

22.8.10



*

quando só escuta a respiração colada no ouvido
lembra o dia que viu um carneirinho na paulista
eu não sonhei isso

17.8.10

i don't see it
i just can't remember.
esse era o começo de tudo
e tudo aparecendo
os teus e a saúde do mar
já não era mais a tourada em madri
era um tipo de piratininga
com ferro e tábua
um estouro no carro forte
e na praia choveu
moedinhas

10.8.10

num ato-espírito
essencial generoso merecido
sob o brilho amarelo questionado
eles explicaram rindo
que é até pecado poupar fotógrafos da luz

num esquema tão quase primeiramente visual
tenho fome
tenho sede

eles vieram
de todos os lados
as caixas de calor e ossos

de todos os lados
cabelos e colares
segredos de água mineral
a mata esticada debaixo da noite
e a mulher do presidente francês

vieram e jantaram
sua refeição de brinquinhos swarovski

um comeu o direito
outro engoliu o esquerdo

26.7.10

meu papagaio que fugiu para o japão
e eu não sei, fiquei sem saber
que aquela rua vai dar naquela outra
bem disse o sujeito: nada parece com nada

eu tinha ido ver uma tourada em madri
os touros estavam debaixo dágua
um deles era amarelo
eu sabia que estava tudo errado
mas na mesma noite você disse que eu era seu petigatô
tipo seu bombonzinho eterno e mesmo com esse meu capricho
você tudo bem
pensei que lindo tudo aquilo de aceitar como eles são
e como nós somos os 3
e não ler jornal porque, caramba, o dia é tão curto

tudo isso porque era assim que devia ter sido
e foi, e está sendo,
não é vovó?
continua olhando que aqui em baixo tudo bem

encontrei a felicidade no festival de dança de seriado japonês
ela estava lá, solta e fazendo coreografia com os demais
ela era uma minhoca de papel colorido e sorria redondo
posando pras fotos do pessoal do flickr

25.7.10

ela era estudante e visitava o estabelecimento terça e quarta
- trabalhava como seguradora dos gatos e galinhas do refeitório.
terça e quarta a junta do ombro dele rangia com o movimento da sopa:
a colher à boca, ao prato, à boca
chorando-se de tanta magia oferecida

6.7.10

cheguei na lanchonete você estava assistindo o jogo.
rimos muito depois de cada almoço, quase todo dia.
eram seis da manhã e o sol alto já. você não bocejou não, só sorriu.
no trabalho vocês estavam cheirando rapé, fumando cigarros e jogando.
nunca mais te vi. quantos anos mesmo?
quando eu era estudante, você era cachorro.
me vesti de uma coisa, pensou que fosse outra. me deu um monte de tempo da sua vida. não era pra dar.
o brasil ganhou, você ficou bêbado, pensou que fosse um lagarto.
caí na piscina e você me deu um anelzinho de ouro.
seu filho nasceu, eu chorei. te perdi de vez.
sua filha nasceu, aí foi muito bom.
te abracei no natal, muitos natais depois. foi o melhor presente.
quando seu fuso horário é +12, fica difícil. mas continua tudo sendo.
você tem nome de bicho e mora no meu jardim.
sua mãe morreu, chorei.
sua mãe morreu. chorei de novo.
você não tinha jeito porque ia voltar pro méxico.
quando você se vestiu de vaca no thanksgiving, ligou pra minha mãe e ficou horas.
assei o peru para a ceia, você guardou ele na geladeira e me levou pra outro país.
fizemos o pirão com farinha de rosca, você com aquele chapeuzinho lamentável. largamos tudo e fomos jogar sinuca.
dancei contigo na festinha, no apartamento apertado e no outro dia você virou adulto.
você me recebeu em casa, sem nunca ter me visto.
te recebi em casa, nunca tinha te visto.
você me detestava na escola mas hoje conserta a casa da minha família e temos muita simpatia.
tomamos um porre numa cidade cheia de turistas e você perdeu o ônibus de volta pra zagreb.
entrei na sua casa pra te botar mais cabelos brancos. deu certo, e ficou muito bom.
esperei um tempão. quando você acordou era a hora de ir embora.

fiquei sem palavras e quase sem lágrimas já.
tirei a aliança, guardei na mão direita. passei no mercado e voltei pra casa.

11.6.10

maybe
quando sentirse ohsoverylonely
ohsofuckin overlonely
maybe
cê pegue um ônibus
e se fores an
ohsomotherfuckin lucky woman
na chegada da manhãzinha de sábado
cê brote novamente na barriga da sua mãe

está na minha voz
alguém cantando
que que tá perguntando de mim aí?

hem
mr. general

taí
passando fome
criando mudo um pterodactruer
debaixo da camisa

taí passando mudo
na frente da vidraça
hem
vem cá

mr. general,
mr. general
volta pra casa

está no meu sopro
e na minha rotina

serpente andando no imóvel
à espera do sinal abrir

vai
mr. general
muda tudo pra ficar igual

2.5.10

alucinada

















Com bandinha de farmácia é melhor.
Falo mal mas acho é bom.
Eu typo como uma hesitante old person on the typewriter
sem essa seu japoneses de quinta.



25.4.10

imagino como seria te amar

teria o gosto estranho das palavras
que brincamos
e a seriedade de quando esquecemos
quais palavras

imagino como seria te amar:
desisto da idéia numa verbal volúpia
e recomeço a escrever
poemas.

-----------------------

Ana Cristina Cesar

28.3.10

Uma valsa para dançar

Américo, eu te amo, Américo. Você tem uma loja de tecidos e uma mulher que você vive querendo não enganar, um filho tão bonitinho, Américo, as mãos macias de medir tecido, de apalpar meu pescoço com intenções de quem vai assassinar. Você é um colosso, Américo, tem tudo pra me agradar. Sua inteligência sem escolas é tão ignorante que eu me arrepio dos seus mundos novos. Dentes afiados, uma saúde enxuta você tem, não vai me pedir um chá. Quando eu te peço um metro de voal, você retruca pra espichar a conversa: "leva também um metro de amorim." Você fala amorim, de sabido ou de bobo, Américo? Antigamente se um homem falasse errado, descartava na hora. Hoje, não. Quero vinho de todos os barris. Você é pai extremoso, exemplar marido caseiro. Tens um livro, não tens? Uma coleção de marcas de cigarro e o retrato da sua mãe. Você fecha a loja aos domingos e feriados, incrível Américo, você não quer ficar rico, como te resistir? Sua mulher me pede açúcar emprestado, eu peço a ela é licença pra ver o álbum de retratos: você segurando seu filho, você pondo comida pra passarinho, brincando com o cachorro. Se você ficar quieto e parar de me espreitar desse modo invisível, eu pinto você, seus olhos bonitos de homem, mais que os de uma mulher, bonitos. Você é meu amor delicado, por você faço doce de leite, corto em pequenos losangos, ponho minha blusa bordada e fico no banco da praça te esperando no seu caminho, quando "cai a tarde tristonha e serena, em macio e suave langor", pra te entregar o coração.

Você passa e eu digo: boa-tarde, Américo.

-------------------------------------------------

Adélia Prado 

aqui tudo cheira corpo
o dono da casa saiu pela janela a porta ficou aberta
sobram as plantas, a mulher e as plantas 
quase não faz diferença entre umas e outra uma se alimenta de madeira 
é madeira os fungos não é?  
costuma o quieto o dia vívido e a noite silenciosa
devolve a ladybug pro lugar dela
gnossiennes
oração
arranjo de travesseiros de solteiro
dormir

ei acorda

sobre a velhice
vivi tanto ela desde nascer
de não ser criança, achar tudo uma babaquice tremenda
ir adiantando o relógio
roubando cinco minutos meia hora
que estupidez a minha
não tem um pássaro no meu peito
nem dos outros nem no meu

podia fazer uns bons amigos contigos
possivelmente seríamos uma família
incomum e feliz até

20.3.10

barba cerrada e rabo entre as pernas, ressabiado feito um órfão
moreno e magro e azeitado por um janeiro lasso , materializado nas primeiras horas do dia
não posso sequer olhar pra tua cara, sei da tua aparência porque te adivinho já fazem anos
não olho lá, não ouso - fui despertada pelo apito fora de hora dessa merda de telefone e não tornei a dormir - escutei tua respiração no pesadelo, peso extra na asa, e deixei você perdido nele
porque o poder na hora era meu  
sem querer te livrar da mordida da serpente, do grito que não sai da boca, da nudez na sala de aula

não desejo mais ser tua mãe, e não serei. 
estou te oferecendo na roda das freiras, você volta quando quiser, quando crescer
posso já estar velha demais, ou ter morrido

detestei o presente que você não me deu, de boca aberta observo sua passada gigante igual salto com vara quando, por estar no ar, você comeu os segundos decisivos da tomada de consciência 
abertura de braços, amanteigamento do cotidiano
perdeu
estou te passando pra ciência, ela merece
não posso olhar na tua cara porque afinal 
meu medo é que você voltou


6.3.10

Lêda

em algum momento
entre a louça e o pato
mataram o gato
roubaram a pipeta
do laboratório
cheiraram maconha
no refeitório
fumaram cigarro de bali
no vestiário
foi o kaos na diretoria